26 de abril de 2010

O NOME DA ROSA

O nome da rosa (www.opopular.com.br, 25/04/2010.

O título acima é uma alusão ao romance de Umberto Eco (1980) e ao filme de Jean-Jacques Annaud (1986), mas fundamentalmente ao julgamento do casal Nardoni e à morte de Adimar de Jesus Santos, assassino de seis jovens de Luziânia, Goiás (2010), porque seus enredos nos permitem entender a transição de conceitos, metodologias, e a superação de paradigmas no tocante às investigações criminais envolvidas em seus ambientes de ficção e realidade.

Mas o que emerge das obras e fatos reais citados é a atividade pericial como inovação à instrução processual penal e à formação da livre convicção judicante do Estado. Na ficção referenciada, as sumárias condenações às fogueiras da Santa Inquisição decorriam da devoção ao sobrenatural e da subjetividade que acomodava os interesses de uma Igreja decadente, símbolo do poder monárquico medieval. No entanto, essa insanidade teológica começa a desabar com o luzir do período renascentista (1300) representado pela investigação criminal procedida por um monge beneditino e seu tutelado. Mesmo distante da queda da bastilha que marca o início do período da razão (1789), a obra de Eco/Annaud anuncia os fundamentos das ciências naturalísticas como método de investigação e observação em detrimento do preconceito, do privilégio, da exceção, da tortura e da tola louvação ao demônio.

No ambiente real e atual esta é uma conquista da humanidade e repercute favoravelmente. A condenação do casal Nardoni determina de forma irreversível que a função pericial do Estado é ferramenta estratégica para que se evitem fogueiras em pleno processo de globalização, hoje simbolizadas pela arbitrariedade e arrogância subversivas que ainda insistem na continuidade do passado clássico de condenações sumárias à margem dos processos legais. É que as soluções para os problemas humanos evoluem a cada dia com a agregação de novos conhecimentos que sempre devem estar a serviço da paz social desejada.

Nesse contexto, a morte do psicopata Adimar de Jesus (de Luziânia) nos alerta e pode significar um misto de ficção e realidade que nos remete ao exame histórico dos processos de investigação criminal experimentados pelo Estado brasileiro. As vítimas de Adimar não terão conhecidas as circunstâncias pelas quais foram barbarizadas, a não ser por rasas ilações, pois o seu desaparecimento impede a reprodução simulada dos fatos que culminaram na hediondez de seus atos. Logo, se inverte a lógica das investigações, porque a demanda do Estado migrou de foco, já que o que se busca agora é a existência ou não de fogueiras em pleno século 21.

Esse apanhado implica confirmar não haver mais dúvidas da hegemonia da prova científica sobre as demais modalidades admitidas – e o caso Adimar, com novo foco, confirmará, especialmente pela toxicologia e física forenses, que a função pericial do Estado se mantém como a mais qualitativa possibilidade de produzir provas no processo da investigação criminal e na formação da livre convicção judicante.

Estreamos o debate criminológico de 2010 com os alucinados Nardoni e o demente Adimar de Jesus como antíteses sociais a assombrar os tribunais, à luz das ocorrências de 1327 debatidas na obra de Eco/Annaud. No entanto, o que de fato os une não é a mórbida coerência analógica acolhida, mas o fato de que ambos os momentos protagonizam o conflito entre os que reverenciam os métodos científicos de produção de provas, e os que deliberadamente insistem na continuidade do passado. Eis porque a rosa se mantém o símbolo dos segredos.

Antenor Pinheiro é jornalista; perito criminal aposentado; especialista em Criminologia pela UFG; e ex-presidente da Associação Brasileira de Criminalística (ABC) perito@antenorpinheiro.com

Um comentário:

  1. Meu seu blog é espetacular, show, not°10 desejo muito sucesso em sua caminhada e objetivo no seu Hiper blog e que DEUS ilumine seus caminhos e da sua família
    Um grande abraço e tudo de bom
    Ass:Rodrigo Rocha

    ResponderExcluir

Aguarde liberação de seu comentário.